A governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), perdeu a autoridade
sobre um pedaço do território do seu Estado. No Complexo Penitenciário
de Pedrinhas, em São Luís, quem manda é o crime organizado. Essa espécie
de terceirização do cadeião maranhense às facções criminosas será
retratada em relatório a ser entregue nas próximas horas ao presidente
do STF, Joaquim Barbosa, e ao procurador-geral da República, Rodrigo
Janot.
Chama-se Douglas de Melo Martins um dos redatores do
documento. É juiz auxiliar da presidência do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ). Após visitar a penitenciária de Pedrinhas, ele adicionou
ao rol de mazelas já colecionadas em inspeções anteriores uma novidade macabra:
mulheres e irmãs de presos são forçadas a manter relações sexuais com
chefes das facções criminosas que controlam a cadeia: o Primeiro Comando
do Maranhão e o Bonde dos 40.
“As parentes de presos sem poder
dentro da prisão estão pagando esse preço para que eles não sejam
assassinados”, relata o doutor Douglas. “É uma grave violação de
direitos humanos.” A atmosfera de caos facilita os estupros. No presídio
do Maranhão, a tradicional separação dos presos em celas não existe
mais. As grades foram arrombadas em rebeliões. Grupos de 250 a 300
presos compartilham suas iras e angústias misturados nas galerias.
Não há nesse inferno prisional espaço adequado para as visitas
íntimas, tal como previsto em lei. O bom senso recomendaria que, em tais
circunstâncias, os contatos físicos dos presos com suas mulheres e
namoradas fossem suspensos. Não foi o que sucedeu no complexo de
Pedrinhas. A direção da unidade não teve pulso para proibir as relações
sexuais. Elas ocorrem ali mesmo, nas celas abertas. Por quê? Ora, porque
os mandarins do crime querem que seja assim.
“Por exigência dos
líderes de facção, a direção da casa autorizou que as visitas íntimas
acontecessem no meio das celas”, conta o juiz Douglas Martins. Em
contato com o secretário de Justiça e da Administração Penitenciária do
Maranhão, Sebastião Uchôa, o enviado do CNJ pediu providências. O
auxiliar da governadora Roseana “prometeu acabar com a prática”. Vivo,
Garrincha perguntaria: ‘Já combinaram com o Primeiro Comando do Maranhão
e o Bonde dos 40?
O olheiro do CNJ trouxe do Maranhão outra
evidência de que o Estado manda pouco, muito pouco, quase nada na
penitenciária de Pedrinhas. A inspeção dos visitantes só alcançou as
áreas que os presos consentiram. “Como as celas não ficam fechadas, os
agentes de segurança recomendaram não entrar”, relata o magistrado
Douglas Martins. Por quê? Os barões da cadeia não autorizaram. “Seria
muito arriscado”, declara o juiz.
Apenas no ano de 2013, estima-se que morreram na penitenciária do
Maranhão mais de 50 detentos. Na penúltima rebelião, ocorrida na semana
passada, feneceram cinco, três deles com as cabeças apartadas dos
respectivos pescoços. Foi a imagem medieval das decapitações que levou o
CNJ de volta às mazelas de Pedrinhas. Acompanhou o doutor Douglas um
representante do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), o
conselheiro Alexandre Saliba.
Na última sexta-feira (20), em
visita à governadora Roseana Sarney, Alexandre Saliba entregou-lhe
ofício remetido pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. No
texto, o chefe do Ministério Público Federal requisitou informações
sobre as providências eventualmente adotadas para deter o descalabro do
sistema prisional. Deu três dias de prazo para o envio de uma resposta.
Roseana disse a Saliba que atenderá à requisição de Janot nesta
terça-feira (24) natalina. Será?
Conforme já noticiado aqui,
Janot cogita requerer ao STF a decretação de uma intervenção federal no
Maranhão. O descontrole da penitenciária de São Luís vem sendo atestado
por emissários de Brasília desde 2011. Pressionando aqui,
você chega a um relatório referente à inspeção anterior à que ocorreu
na semana passada. Deu-se em outubro de 2012, nas pegadas de outra
rebelião, que levou à cova dez presos.
O documento faz menção a uma audiência dos inspetores
com Roseana Sarney. Nessa reunião de um ano e dois meses atrás, a
governadora prometera erguer 11 novos presídios em seis meses –um em São
Luís e outros dez no interior do Estado. Entre uma rebelião e outra,
com a promessa da governadora de permeio, nada mudou na cadeia de
Pedrinhas. A penitenciária continua sendo o melhor local para a
construção de um Maranhão inteiramente novo. Caos não falta.
Por Francisco Portelça e Edil Aranha
Fonte: Blog do Josias
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